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segunda-feira, 7 de abril de 2008

Eleições no Paraguai

Sempre me intriga o fato do Paraguai ser tão invisível no noticiário brasileiro e latino-americano, a menos que o assunto seja policial ou policialesco.
Nem no período eleitoral, nossos "hermanos" paraguaios tem merecido da mídia o espaço que lhes é digno. Meio sem entender o porquê, arrisco um palpite: seria o fato de que o partido de direita "colorado" que governa aquele país há 60 anos consecutivos aparece em terceira posição na preferência dos eleitores paraguaios. Aliás, talvez o grande perigo mesmo é o fato de que ao divulgar que os colorados estão nesta posição, o que poderia ser natural devido ao fato de estar no poder ha 60 anos, o perigoso mesmo é ter que dizer que quem está em primeiro lugar na preferência, é nada mais nada menos, que um ex-bispo da igreja católica, militante de esquerda e adepto da teologia da libertação.
Como se pode verificar, há três perigos para PIIG (Partido Internacional da Imprensa Golpista) em pôr em evidência a eleição paraguaia:
1º. O fato de que a esquerda provavelmente irá chegar ao poder em mais um país da américa latina, dando seqüência ao que já ocorreu na Venezuela, Argentina, Brasil, Bolívia, Equador, Chile, Urugai, Nicarágua (são os que recordo neste momento). Isto poderia ser perigoso sobretudo neste momento em que o último satélite dos EUA na região (Colômbia) encontra-se em crise por conta do desgaste e dos conflitos entre o presidente (acusado de ser apoiado por paramilitares narcotraficantes de direita colombianos) Àlvaro Uribe, que pretende propor reforma na constituição colombiana para poder disputar o terceiro mandato consecutivo. No Brasil e na Venezuela o PIIG (Partido Internacional da Imprensa Golpista) considera que um projeto deste tipo, mesmo quando é proposto por meio de plebiscito, isso é considerado golpe à democracia, simplesmente porque seus presidentes são de esquerda. Na Colômbia que é governada por George W. Busch através do capataz Álvaro Uribe, é perfeitamente democrático e ninguém pode questinonar. Se a moda de eleger presidente de esquerda chegar à Colômbia, a Casa Branca ficará furiosa.
2º. O candidato melhor colocado nas pesquisas eleitorais paraguaias, o Fernando Mendes Lugo é um ex-bispo da Igreja Católica, que deixou o episcopado exatamente para poder disputar a eleição e não contou com o apoio do Vaticano, mais alinhado à Casa Branca, quartel ideológico do atual governo paraguaio e conseqüentemente do partido colorado.
3º. O risco de se "ressuscitar" a Teologia da Libertação na América Latina, uma vez que a extrema direita e o Vaticano são seus principais opositores. Isso seria muito ruim e não se sabe se seria possível repetir no Paraguai o que fizeram no Haiti quando aquela nação democraticamente elegeu o ex-padre Jean Aristide, presidente daquele país. Até hoje não ficou crível para os mais esclarecidos não vitimados pela mídia que a miséria e a atual situação do Haiti não pode ser atribuída ao governo de Aristide, e sim às ditaduras militares e aos dois últimos golpes dados contra seu governo, pelos Estados Unidos e França.
Como disse, "desconheço" o desinteresse da mídia brasileira e latino-americana em noticiar as eleições paraguaias que ocorrerão no próximo dia 20, mas nada me convence que estes fatores não sejam uma boa razão para isso.

Abaixo, transcrevo matéria do Agência de Informações Frei Tito para América Latina, expondo um possível conflito de interesses entre Brasil e Paraguai.


Adital - Com freqüência procura-se retratar o projeto político que lidero no Paraguai como sendo "antibrasileiro". Nada poderia estar mais distante da verdade. Todos os que integramos a Aliança Patriótica para a Mudança (APC, na sigla em espanhol) temos profundo respeito pelo povo, pelas instituições e pelo governo brasileiros. Nosso objetivo é avançar em direção a uma cooperação maior sobre bases justas.

Os povos do Paraguai e do Brasil herdamos problemas cujas raízes estão nas ditaduras militares. Estamos certos de que devemos enfrentar esses problemas e encontrar soluções para eles.

Durante a ditadura de Alfredo Stroessner, foram gerados negócios de fronteira, em muitos casos ilícitos.

Hoje, muitos paraguaios e brasileiros vivem dessa atividade. Precisamos acabar com a doença, mas sem matar o doente (os postos de trabalho) -pelo contrário, curando-o (com mais empregos dignos). Precisamos avançar juntos num processo de legalização e intensificação da produção em toda a região da fronteira.

Foi também na época das ditaduras que ocorreu uma forte migração de colonos brasileiros a território paraguaio virgem. Hoje, o meio ambiente está devastado, e a população camponesa paraguaia se vê encurralada pelos grandes produtores de soja (que não são apenas "brasiguaios", mas também paraguaios ou de outras nacionalidades), que empregam agrotóxicos com pouco controle.

A maioria dos antigos colonos brasileiros hoje já tem filhos paraguaios e respeita as leis. Os que assim procedem não terão dificuldade com nosso governo. Em contrapartida, aqueles -seja qual for sua nacionalidade- que não obedecem às leis deverão começar a fazê-lo.

Nunca, por convicção própria, vamos discriminar ninguém por sua nacionalidade, raça, religião ou simpatia política. Esse é um compromisso de todos os integrantes da APC, avalizado por nossa trajetória de luta pelos direitos humanos.

Estamos convencidos de que -sob condições de eqüidade- Itaipu será o principal instrumento de integração dos povos paraguaio e brasileiro.

Alguns afirmam que, mesmo quando for muito injusto com o povo paraguaio, o tratado de Itaipu deve continuar em vigor até 2023 tal como foi firmado em 1973, sob as ditaduras militares do Brasil e do Paraguai.

Não existe fundamento para a manutenção dessa atitude. Queremos dialogar com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva partindo da própria base do tratado de Itaipu: a ata de Foz do Iguaçu (1966), firmada e ratificada pelo Brasil. Ela está em vigor e assinala que o Paraguai deve receber um "preço justo" pela energia que exporta ao Brasil. Queremos dialogar sobre esse ponto aceito pelas duas partes.

Quando foi assinado o tratado de Itaipu (em 26 de abril de 1973), o petróleo custava pouco mais de US$ 2 por barril. Hoje, seu preço está em torno de US$ 100 por barril.

O Paraguai recebe hoje por sua energia muito menos, em termos reais, que em 1973. Hoje podemos comprar muito menos petróleo que há 35 anos. E consta que, naquele ano, toda a opinião pública paraguaia viu como irrisórios os benefícios fixados no tratado. Não pretendemos cobrar o que não nos pertence. Aspiramos só a um "preço justo", como o Brasil concordou em nos pagar em 1966.

Chegar a um acordo justo em Itaipu vai possibilitar o melhor desenvolvimento dos dois países. Quando não existe um "preço justo" entre um país mais poderoso e outro mais fraco, predomina o conflito, mais que a cooperação. As duas nações saem perdendo. Por isso, quando propomos chegar a um "preço justo", estamos contribuindo para o desenvolvimento melhor de ambas as partes.

Assim se entendeu na Europa quando foram mantidas as assimetrias entre as nações e regiões menos desenvolvidas e as mais desenvolvidas. Assim entendemos nós, que desejamos um Paraguai soberano e integrado ao Mercosul, fortalecendo vínculos com o Brasil e seu povo sobre bases justas.

Nas eleições de 20 de abril, existem duas opções: o desenvolvimento harmônico dos dois países ou o desenvolvimento excludente do Brasil e a ruína do Paraguai, caso em que nosso país será mais uma vez pólo de tensões e problemas na região.

Não temos dúvida de que a primeira é a opção correta. Como dizemos em nossa língua indígena, "oñondive mante jajapóta" ("só juntos é que vamos poder fazer"). Nesse "juntos" incluímos não apenas o Paraguai, mas também o Brasil.


FERNANDO LUGO MÉNDEZ, 56, licenciado em ciências religiosas, ex-bispo da Diocese de San Pedro (1994-2005), é candidato à presidência do Paraguai pela APC (Aliança Patriótica para a Mudança, na sigla em espanhol).

[Publicado na Folha de São Paulo, 02/04/2008. Tradução de Clara Allain]

* Licenciado em ciências religiosas, ex-bispo da Diocese de San Pedro (1994-2005), é candidato à presidência do Paraguai pela APC (Aliança Patriótica para a Mudança, sigla em espanhol)


Fonte: http://www.adital.org.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=32397

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