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sábado, 10 de maio de 2008

O que influenciou a década de 90 em Riachão do Jacuípe

Os últimos anos da década de 80 foram decisivos para um início de tomada de consciência de parte da juventude jacuipense.

Como já fora dito em "O conto do vigário?" existia(?) uma grande promiscuidade entre os abusos de poder dos políticos locais e a igreja católica. O conto acima citado, retrata a mais nua verdade na modalidade contística. O autor realmente viveu todos aqueles fatos e fez uma análise retrospectiva do que era a paróquia antes, fazendo as personagens Antônia Pia e Maria Santa compararem com o que se tornou na década de 90.
Lembro com angústia daquela realidade. O professor municipal recebia salários correspondente a um décimo do salário mínimo vigente na época, com atraso de quatro a cinco meses e num período em que a inflação no Brasil passava dos 80% ao mês. Se um professor recebia esta quantia absurda, imagine o quanto recebia um gari. Não se pode deixar escapar a este relato a instalação do "paraíso da agiotagem" criado e gerenciado pelo prefeito que tomava dinheiro de agiotas para pagar com os recursos públicos. O resultado deste crime de lesa municipalidade era o atraso do pagamento dos funcionários públicos e fornecedores do município. Absurdos do tipo aconteciam e outros acontecem ainda hoje.
Em 1989 tive a honra de ter sido eleito coordenador de um grupo de jovens católicos que fez história nesta cidade. Deste grupo, começou a nascer uma Pastoral da Juventude na paróquia e esta pastoral é em grande parte responsável por período áureo, na minha avaliação, de atuação verdadeiramente libertadora da igreja católica local.
Até o ano de 1991, mesmo com as injustiças e absurdos cometidos contra os servidores municipais e a população como um todo, a postura da pároco era a de um verdadeiro, ou melhor, do maior e mais eficiente cabo eleitoral daquele sistema corrupto e injusto ao extremo.
Tal situação fez com que alguns jovens integrantes do Grupo Jovem Cristão DDD (Discagem Direta a Deus), começasse a se inquietar com aquela situação.
Certa vez, participei de um encontro da Pastoral da Juventude do Meio Popular, em Feira de Santana e lá tive um primeiro contato com as idéias da Teologia da Libertação. Para mim foi um choque saber que na igreja havia um grupo de teólogos que falava abertamente da situação política, dando destaque à Doutrina Social da Igreja. Apesar do choque, já que eu era um verdadeiro beato, conservador, retrógrado, vítima da ideologia das devoções desprovidas de sentido teológico, percebi aos poucos, meditando por um longo período após aquele encontro, o quanto os católicos desconhecem sua religião. São grandes conhecedores de devoções e extremamente pobres de conhecimento doutrinário. Sobretudo ignorantes da Doutrina Social da Igreja.
Nos meus questionamentos, perguntava-me se era certo a igreja falar de política. Demorei muito a aceitar a idéia. Depois percebi que o que a igreja local mais fazia e ninguém percebia era o papel de cabo eleitoral do sistema mais corrupto e perverso que já conheci na política de Riachão do Jacuípe.
Naquela época tínhamos como pároco o Pe. Severino, um velho cheio de carisma para conquistar o povo simples. E esse carisma era utilizado pelos prefeitos e seus asseclas para garantir uma imagem de bons cristãos.
Além de integrarem os movimentos religiosos existentes na paróquia, a exemplo dos Cursícilios de Cristandade, integravam as comissões de festas dos padroeiros, faziam palestras nas comunidades, freqüentavam as novenas e suas festas de largos arrematando leilões com lances altíssimos, e uma infinidade de atividades religiosas, além de serem bastante generosos em doações à paróquia.
Já ouvi de um sucessor que quando assumiu o cargo de pároco, ficou sabendo que o motorista do antecessor recebia um salário pago pela paróquia, outro pago pela prefeitura de Riachão do Jacuípe, outro da de Pé de Serra e ainda outro da de Serra Preta.
Era raro o domingo em que o padre, antes de finalizar a celebração da missa, não convidava o prefeito para ir até o presbitério da igreja e neste local de destaque, convocava os fiéis para saudar o prefeito com aplausos, porque este havia fornecido combustível para o carro da paróquia, porque havia doado uma janela para a capela da comunidade tal, porque doara lâmpadas para a igreja matriz... enfim, todas as despesas da paróquia e do pároco, e ainda de alguns fiéis beatos que tocavam os sinas da igreja e/ou cantavam durante as missas, era custeado pela prefeitura, e tudo o que o prefeito fizesse pela igreja era pago com aquela moeda, a moeda dos aplausos que tanto contribuía para manter imaculada a imagem do prefeito perante a comunidade.
Ao analisar esta situação, certo dia numa das reuniões do grupo que se reunia todos os sábados, após a leitura do evangelho, fazíamos uma reflexão partilhada, então nesta oportunidade lancei a pergunta aos demais jovens, se achavam correto a igreja falar sobre política. A imensa maioria não concordava. Religião e política não se misturam. Foi a opinião massificante. Então perguntei: Se não é correto falar de política, então porque ninguém se incomoda quando o pároco presta serviços de cabo eleitoral na igreja?
Alguns ficaram chocados com a pergunta, parecia uma acusação terrível. Como assim? Perguntavam. Eu nunca vi ele pedir para votar em candidato algum.
Continuei com as provocações que sempre nos permitiam analisar a situação e no final, a imensa maioria se convenceu de que estávamos sendo usados para sustentar um sistema político vergonhoso que estava na mais absurda contradição com o evangelho.
Daí por diante, em nossas participações nas celebrações eucarísticas dominicais, nas festas de padroeiros, em eventos que realizávamos, sempre fazíamos esses questionamentos, promoviamos palestras, criávamos e apresentávamos jograis e peças teatrais com essas mensagens.
Começamos a ser admirados pelo nosso talento e também antipatizados pela nossa ousadia de "subverter" a religião. O pároco logo se incomodou e passou a nos perseguir.
Outros problemas de ordem impublicável tinha chegado ao conhecimento da congregação do padre em Roma e o Superior Geral da Congregação esteve aqui em Riachão, reuniu-se com vários grupos da paróquia, inclusive com membros do DDD e depois desta visita o pároco perdeu o cargo.
Em 08 de dezembro de 1991, chegou em nossa paróquia um padre auxiliar, que um ano depois foi empossado como pároco, e este, deu total apoio e respaldo ao grupo jovem DDD, organizou a Pastoral da Juventude, cuja atuação na paróquia criou, viveu, sofreu e sorriu pelas mudanças que ocorreram no âmbito paroquial religioso, bem como, municipal e político que durou até... (Ah! se eu soubesse e pudesse responder?).
Para não ficar muito extenso, prometo continuar no outro post as transformações realizadas na paróquia sob o pastoreio do Pároco Padre José Silvino Santos.

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