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sexta-feira, 16 de maio de 2008

O Santo protetor do Brasil

Existe, por parte de uma minoria, um certo preconceito contra certas culturas populares. O cordel por exemplo é uma delas. Falta a algumas pessoas a percepção de como os artistas populares, muitas vezes sem grande escolaridade, tem uma imensa capacidade de captar conhecimentos históricos, sociais, geográficos e políticos. Dão a impressão de serem grandes satélites que captam certos acontecimentos, fatos e ideologias e as escancaram com tamanha segurança que impressiona e surpreende até mesmo os que acham bem informados e/ou portadores de grande conhecimento.
Posto abaixo um exemplo disto, na transcrição de uma declamação por Carlos Neves, um coiteense extraordinário, grande divulgador da cultura do cordel. A autoria da crônica é de Chico Pedrosa, com algumas adaptações de Carlos Neves, a quem presto também uma homenagem e manifesto a alegria por poder compartilhar com ele uma grande amizade e admiração.

O SANTO PROTETOR DO BRASIL

Chico Pedrosa

(com adaptações de Carlos Neves)


Um cronista escreveu nas páginas do Matutino, sobre uma sala que existe no céu, com o Deus Divino, onde trabalham os santos, que protegem com seus mantos as nações aqui na terra, e são por São Pedro escalados, pra livrar os afilhados das influências da guerra.

São quase duzentos santos, que na atualidade passam dez horas por dia cheios de boa vontade, sentados de sentinela, com os olhos fixos na tela, mexendo em fios e chaves, botões e computadores, e aparelhos transmissores de sons agudos e graves.

À distância, até parece que estão se divertindo, mas, na verdade estão fazendo um esforço infindo, para proporcionar conforto e vida exemplar aos filhos das nações aos quais são responsáveis pelos serviços prestados as futuras gerações.

Como em repartição pública, um trabalha e outro ganha, o santo da Dinamarca vive comendo na manha. Assina o ponto e cochila. Já o senhor são Tequila, protetor da Nicarágua, não tem tempo pra dormir e nem pra ir ao banheiro verter água. São Pedro nomeia o santo de acordo com o país, quando a nação é pequena, rochosa, pobre, infeliz; escolhe um santo valente, trabalhador, competente, mão de ferro, talentoso; mas quando sente que a nação não precisa de proteção, manda um santo preguiçoso. O Canadá por exemplo, depois da emancipação, São Pedro entregou a um santo pequeno e sem projeção, inda hoje vive lá, porque para o Canadá qualquer santo é protetor. Não precisa ser titã como o santo do Irã, Iugoslávia, Iraque e El Salvador. No dia que o Brasil se tornou independente, um anjo chamou São Pedro pra ver o nosso continente. São Pedro Olhou lá de cima viu a fauna, a flora, o clima, o lago, a costa e a extensão, e disse:

- Ô Terra Boa! Vou mandar um santo a toa para proteger esta nação.

- Imediatamente escolheu São Brás, seu afilhado, que a mais de cem anos no céu vivia encostado, não conseguia trabalho, vivia de quebra galho, respondendo pelos danos que causou, quando criança, à população da França pela Guerra dos Cem Anos. E porque no século passado, tomando conta da Espanha, um dia, contra a vontade, se via em palco de aranha. Por falta de competência, assinou numa audiência uns papéis desconhecidos, que só nessa assinadinha, vendeu a Flórida inteirinha para os Estados Unidos. Só depois de muito tempo, declarou ter aprendido e disse a São Pedro que estava arrependido e precisava trabalhar, e mesmo queria provar que não era incompetente, fez aquela choradeira de um falso cego na feira quando quer roubar a gente. São Pedro disse:

- tá certo, mas não bula nesta mesa, porque o país, Brasil, cresce só eu tenho certeza.

- Era o que São Brás queria, passava as horas do dia sentado numa bodega, do pai de santo à Lucrécia, com o santo da Suécia, da Dinamarca e Noruega; até que em sessenta e quatro, quando menos esperava, entrou um funcionário correndo onde ele estava, dizendo:

- corra São Brás, que mais de uma hora faz que sua mesa balança, e pelo o que eu pude apurar, tão querendo bagunçar o chão da Boa Esperança.

- Mas, na verdade, não era nada especial, foi só um curto-circuito que deu na chave geral. Porém, pelo compromisso e para mostrar serviço que inda não tenha mostrado, São Brás ligou um botão e apareceu no telão escrito “GOLPE DE ESTADO”. Levantou-se São Pierre, velho protetor da França, e disse:

- São Brás, por Nossa Senhora, você parece criança, preste atenção no trabalho, corrija o serviço fácil enquanto tem energia, está com sono? Desperte! Corra ligeiro aperte o botão da DEMOCRACIA.

- São Brás, ao invés de apertar o botão da democracia, confuso, enfia o dedo no botão da CARESTIA. Ligou o da INFLAÇÃO, da REPRESSÃO, a sala ficou escura, teve santo que correu, e quando o painel se acendeu tava escrito “DITADURA”, por último, abriu as válvulas das multinacionais, ligou a chave que acende os apertos salariais, quebrou o interruptor da Lei do Trabalhador que tava no seu nariz e todo o controle tremia, quanto mais São Brás mexia, mais bagunçava o país. Até que chegou um ponto que nada mais dava certo, quando cobria um lado, deixava o outro descoberto, se cobria o empresário, descobria o operário, se cobria o produtor, descobria quem comprava, e no fim a bomba estourava na mão do consumidor.

- Só existe uma saída, vou já conversar com Deus. Deus como um bom brasileiro, dará jeito aos erros meus.

- Aí pegou o cajado, vestiu um terno engomado, saiu falando sozinho; mas quando chegou no trono encontrou Deus de quimono, comendo arroz de pauzinho. Só aí ficou sabendo que Deus era japonês. Se Deus fosse brasileiro, o Japão teria vez? Logo um país pedregoso, altamente populoso, nos confins orientais? No tamanho, um dos menores, hoje, um dos três maiores poderios mundiais. Se Deus fosse brasileiro, será que consentiria uma inflação galopante roer nossa economia? Permitiria a nação sem saúde e educação andar com um pires na mão mendigando no estrangeiro? Deixaria o desemprego roubar a paz e o sossego da casa do brasileiro? Permitiria a reeleição de tanto cabra ladrão pra roubar o nosso dinheiro? Paremos com esta história de que Deus é brasileiro, e tratemos de ficar com São Brás, o timoneiro, mexendo em seus botões, no painel de operações, já que o destino assim quis, agora nos resta rezar pra São Brás renunciar e a nova santa querida Nossa Senhora Aparecida assumir o controle do país.


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