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terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O sacrifício de Serra


A relutância do governador José Serra em assumir sua candidatura à Presidência não é jogo de cena nem estratégia eleitoral. O fato é que, apesar de termos passado todo esse tempo vendo manchetes sobre como ele seria eleitoralmente forte, disputar com a candidata de Lula a sucessão presidencial será quase um suicídio para o tucano.
Pode parecer surpreendente uma afirmação dessas, mas isso só porque o Brasil tem sido vítima de uma impostura estatística digna da Alemanha nazista, em termos de se enrolar o público sobre as candidaturas a presidente no ano que vem.
Essas manchetes e análises que passamos o ano lendo nas Folhas e Vejas da vida dando conta das “grandes” possibilidades de Serra se eleger presidente e decretando que a candidatura de Dilma Rousseff seria um fracasso valeram-se do fato de o tucano ser conhecido pelo eleitorado e de a candidata de Lula ser desconhecida.
Por envergar o figurino anti-Lula Lula da vez devido à sua movimentação política de 2002 para cá, Serra já partia de uma intenção de voto consolidada por aqueles setores da sociedade que estão organizados desde 1º de janeiro de 2003 contra o atual governo.
Só um jornalista totalmente inexperiente – ou muito mal-intencionado – poderia ver qualquer tendência de não decolar eleitoralmente a pessoa escolhida por Lula para sucedê-lo, para suceder simplesmente o presidente mais popular que o Brasil já teve e com o apoio explícito e engajado deste.
A falta de lógica na premissa de que um povo fortemente satisfeito com seu governo não apoiaria a continuidade desse governo é tamanha que não consigo conceber que os experientes jornalistas de uma Globo ou de uma Folha ou de uma Veja ou de seus similares tenham sequer chegado perto de acreditar nela.
Agora, porém, as coisas começam a ficar mais claras, sobretudo porque os números que faziam insinuações já começam a gritar, aqui e ali.
A despeito de a lógica vir dizendo faz tempo que a intenção de voto ainda majoritária de Serra não era mais do que conjuntural e tendente a ser revertida, quem vi destacando primeiro o indício mais gritante do potencial da candidatura Dilma foi o blogueiro carioca Miguel do Rosário.
Em seu blog “Óleo do Diabo”, meses atrás, Miguel chamou atenção para o fato de as intenções de voto em Dilma estarem, desde então, mostrando-se maiores nas classes sociais mais altas do que naquelas que dão maior apoio a Lula, que todos sabem que são as mais baixas.
Essa tendência passou a gritar, agora. Dilma já lidera as pesquisas espontâneas (quando o entrevistado diz o nome de seu candidato sem ser estimulado por nomes mostrados pelo entrevistador) sobre a sucessão presidencial junto às classes A e B.
Não creio que haverá muitas dúvidas sérias – e não estou me referindo àqueles que simplesmente se recusam a ver os fatos por partidarismo – de que, entre os mais pobres, quando a campanha estiver na rua Dilma tenderá a aumentar muito seu percentual de intenções de voto.
Com a expressiva queda da distância que separa Dilma de Serra nas pesquisas e sabendo-se que a maioria da sociedade, que não se interessa por política fora dos períodos eleitorais, ainda não pensou sobre a substituição de Lula, fica claro, pois, que o tucano se arriscará demais ao abrir mão de uma reeleição tranqüila em São Paulo – e governar o Estado mais rico do país não é pouco.
Por outro lado, a desistência de Serra seria fatal para a oposição de centro-direita (PSDB e DEM). O ex-PFL está praticamente morto. Desde 2002, vem se desidratando ao ponto de ter tido que mudar de nome para prolongar o processo de apodrecimento da legenda. Já o PSDB, sem um nome forte à sucessão de Lula e com a perspectiva de seus caciques do Norte e Nordeste nem se reelegerem, certamente encolheria muito.
A oposição que hoje está perdida, sem discurso e ultra-radicalizada ainda tem número no Congresso para causar problemas ao governo. Contudo, sem um cabeça-de-chapa em condições de ser o anti-Lula da vez – e, ao menos na próxima eleição, é o que será o candidato que polarizar com o PT –, nem mais isso a oposição terá.
Não sei até que ponto é bom para a democracia que um só grupo político consiga tal hegemonia, mas há que ressaltar que, se ela se concretizar, decorrerá não da ação do governo Lula e das forças que o apóiam, mas da estratégia burra e autoritária de seus adversários.
Desde a eleição de 2006, a centro-direita e seus jornais, rádios, televisões etc. deveriam ter entendido o recado das urnas, mas se recusaram a fazê-lo. Se tivessem mais cérebro e menos fígado, os Marinhos, os Civitas, os Frias, os Mesquita, o Serra e o FHC teriam percebido que o povo lhes disse que não acreditava neles.
Foram dois anos (2005 e 2006) de noticiário massacrante e incessante em todos os meios de comunicação de massa. A mídia fez tudo que era possível e até o impossível para destruir Lula e o PT, subvertendo leis, promovendo censura do contraditório, inventando notícias etc. Ao fim de 2006, o povo foi às urnas e disse que não acreditava nessa mídia e reelegeu aquele que ela pintou como um bandido.
A partir dali é que deveria ter começado uma estratégia que só de alguns poucos meses para cá temos visto a mídia adotar, a estratégia de tentar afetar “isenção”. Hoje, por exemplo, a Folha volta a dizer que não é bom que os tucanos governem São Paulo por tanto tempo, tem o “mensalão do DEM” (só agora) e as críticas ao prefeito Gilberto Kassab, títere de Serra.
Devo dizer que mal consigo acreditar que os donos desses grandes impérios de comunicação tenham achado que ninguém notaria que eles atacavam só um lado e protegiam o outro de uma forma absolutamente suspeita, pois os erros do grupo político que o país alijou do poder em 2002 jamais foram aceitos pela mídia e os acertos inegáveis deste governo foram todos negados sistematicamente
Apesar da enorme desaprovação de FHC, a mídia continuou tecendo loas a ele e este continuou avalizando Lula como seu antípoda ao confrontá-lo ruidosamente, porque, vaidoso, não podia e não pode aceitar que seu nome fique na história como o de um mau governante enquanto um “peão” se torna um estadista para a posteridade.
Voltando, pois, ao tema central deste texto, concluo que Serra não tem mais como recuar. Terá que ir para o sacrifício disputando a eleição do ano que vem com a candidata de Lula para manter a oposição viva. Aécio Neves seria um fiasco ainda maior, em minha opinião. É um mero cacique regional que não vejo deslanchar.


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