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quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Emiliano José revela os "méritos" do governo Paulo Souto

Discurso sobre escândalos no Governo Paulo Souto


Dia 13/10/2009

Sessão: 279.3.53.0

O SR. EMILIANO JOSÉ (PT-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, em discurso no dia 30 de setembro, aqui nesta Casa, falei sobre o caso da Ilha do Urubu, ocorrido na Bahia, em novembro de 2006, quando estava em fim de governo o senhor Paulo Souto, do DEM. O ex-governador da Bahia está sendo acusado de ilegalidade em uma ação popular que tramita no Tribunal de Justiça da Bahia acerca do processo que envolveu a escandalosa, estranha, suspeita doação de terras da “Ilha do Urubu”, localizada no município de Porto Seguro, área da Costa do Descobrimento, no Extremo Sul da Bahia.

De acordo com as informações fornecidas à imprensa pelo advogado César Oliveira, ao final do seu governo, Paulo Souto doou a Ilha do Urubu aos herdeiros da família Martins, posseiros da área em questão. Quatro meses depois, os herdeiros venderam essas terras ilegalmente. Teriam que preservá-las por cinco anos. A ilha foi vendida por 1 milhão de reais ao empresário Gregório Marin Preciado.

Segundo Oliveira, “mais ou menos um ano depois, Gregório Preciado revendeu o terreno a um mega-especulador belga, Philippe Meeus, por 12 milhões de reais”. Para o advogado: “No mínimo, houve leniência por parte do Estado. O terreno vale, hoje, 50 milhões de reais, pois se trata de uma das áreas mais valorizadas da América Latina”. É quase incrível tenha isso ocorrido, mas ocorreu.

Hoje volto a esta tribuna para trazer à luz outras informações sobre o governo de Paulo Souto e de seu antecessor, César Borges. Para evidenciar que o caso da Ilha do Urubu não se constitui numa exceção durante aquele período.

Na Bahia de então, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, a ação governamental foi praticamente privatizada, transferida para setores empresariais umbilicalmente ligados à corrente política que predominava no Estado. Reuniam-se ali elementos do passado, uma típica oligarquia, com ingredientes do neoliberalismo, ideologia que ainda resistia, apesar de já dar sinais de fadiga. Constituiu-se uma intrincada rede onde se mesclavam interesses públicos e privados, com predomínio dos interesses privados, que gerou diversas denúncias na imprensa local e até nacional.

Quando falo em interesses privados, esclareço tratar-se, neste caso, de um grupo restrito de empresários. O grupo era constituído por pessoas intimamente ligadas à oligarquia. Sempre quando penso naquela Bahia, me recordo do memorável romance de Vargas Llosa, A Festa do Bode, onde se retrata a República Dominicana quando do domínio do patético ditador, o tristemente famoso Rafael Leônidas Trujillo Molina, que chegou a ser denominado Pai da Pátria.

Ali, na República Dominicana, Legislativo, Judiciário e o Executivo estavam sob uma chefia – tal e qual na Bahia oligárquica de então. Lá, ruas, aeroportos, vielas, escolas, avenidas, tudo levava o nome do ditador. Qualquer semelhança com a Bahia não será mera coincidência.

Acodem-me, ainda, Sr. Presidente, ao pensar como o poder era exercido na Bahia oligárquica, as palavras de Primo Levi, em seu Os afogados e os sobreviventes: “Onde existe um poder exercido por poucos, ou por um só, contra a maioria, o privilégio nasce e prolifera”. Nada mais próprio para a Bahia de então.

A Bahia, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, já se libertou daquele tipo de domínio. Não impera mais a lei do chicote numa mão, a sacola de dinheiro na outra, expressão tão a gosto dos senhores de então. Vivemos tempos republicanos e democráticos sob o governo Wagner, depois da vitória de 2006.

O povo do meu Estado decidiu isso nas eleições. E vem sentindo os efeitos de um novo modo de governar, voltado para as maiorias, atento às necessidades da população, especialmente da população mais pobre. Um Governo que não discrimina, que não persegue e que trata o dinheiro público com absoluto rigor.

Volto ao passado, Sr. Presidente, no sentido de evidenciar que o Estado baiano sob domínio oligárquico comprovadamente foi assaltado por interesses menores, subalternos, privados, que nada tinham a ver com o interesse público. A mistura dos interesses oligárquicos com o neoliberalismo gerou um modelo perverso, que prejudicava enormemente a maioria do povo, sacrificava as políticas públicas, enchia as burras de uns poucos, incluídas aqui as burras da oligarquia. Vamos demonstrar isso.

Em 2006, no bojo de mais uma operação da Polícia Federal, explodiram informações na imprensa baiana, que envolviam contratos estaduais nas áreas de vigilância, limpeza e terceirização de mão-de-obra, com um conjunto de empresas denominado pela mídia de G-8. O escândalo refletia um conteúdo assustador pela enormidade dos valores públicos envolvidos. Algo em torno de R$ 1,3 bilhão, além da impressionante e reveladora teia de inter-relações entre os integrantes dos grupos envolvidos e das empresas participantes.

Já dissemos que nas últimas décadas o continuísmo político na Bahia gerou uma grande proximidade entre o grupo politicamente dominante e alguns poucos setores empresariais, chegando a produzir, em alguns casos, relações suspeitas e até conluios promíscuos.

A repetição de escândalos denunciados por parlamentares, pela imprensa e pelo Ministério Público levava sempre à mesma conclusão de que essas imbricações ilícitas faziam parte de uma estratégia de dominação política e econômica, em busca de poder e enriquecimento.

Nesse pronunciamento, para mostrar que a Ilha do Urubu não é exceção, abordo apenas algumas denúncias de contratos referentes às áreas de vigilância, limpeza e terceirização de mão-de-obra. No entanto, antes de continuar, destaco que na Bahia de então, algumas outras áreas eram foco de escândalos periódicos, que nunca foram devidamente e publicamente esclarecidos tais como publicidade; informática e telecomunicação; empreiteiras e obras; fornecimento e locação de materiais (particularmente de veículos e computadores); arte e cultura; gestão de órgãos públicos; despesas da Casa Militar entre tantos outros.

A maior parte das tais empresas prestadoras de serviços, participantes do escândalo investigado pela PF, iniciou suas atividades, ou teve sua propriedade transferida para os grupos societários envolvidos com as irregularidades, no começo da década de 90, o que corresponde ao reinício das administrações oligárquicas. Coincide também com o período de Collor de Mello na presidência da república, e com a adoção plena dos conceitos de minimização do estado e de transferência ao setor privado de atividades antes realizadas pelo próprio setor público.

Pelos dados levantados, é inevitável constatar que, com o decorrer do tempo, as empresas contratadas foram se especializando, entre outras coisas, em mecanismos de burla da concorrência pública, em desvios na execução dos contratos, bem como em aditamentos irregulares, eternizadores dos contratos. Tudo sob o olhar conivente, cúmplice do governante, como é óbvio.

O Estado, sob a gestão oligarco-neoliberal, foi se aprimorando em evitar a transparência dos dados. Escamoteava informações nas publicações de atos oficiais. Era useiro e vezeiro em vícios nas concorrências, na superestimação de valores, no não acompanhamento efetivo da execução dos serviços, na fabricação de falsas emergências para aditamentos repetitivos, entre outros subterfúgios e artimanhas para garantir os interesses do seleto grupo de empresários que controlavam a máquina governamental.

Além de não criar uma estrutura estatal capaz de centralizar e sistematizar as informações gerais de contratos e convênios, desenvolveu-se, em sentido contrário, uma verdadeira cultura institucionalizada de redução da importância do controle dos gastos públicos.

Como produto desse sistema corrompido foi sistematicamente negada, pelos governos da oligarquia, a abertura aos parlamentares baianos da senha de acesso às informações econômico-financeiras do Estado. Nem os Deputados, nem a população tinham acesso a quaisquer informações sobre a movimentação econômico-financeira do Estado. Esse era um direito sonegado, um direito da cidadania, e sonegado à luz do dia, desavergonhadamente. Um direito que passou a ser rigorosamente respeitado sob o governo Wagner.

As informações encontravam-se totalmente pulverizadas, os sistemas informatizados não se intercomunicavam, os resultados de auditorias não eram valorizados nem geravam conseqüências, nunca ocorrendo a devida apuração e punição das ilicitudes. Em decorrência da persistência dessa cultura internalizada no aparelho do Estado, de rejeição dos mecanismos de controle e investigação, era quase impossível a obtenção de informações consistentes e conclusivas acerca das finanças públicas.

Vou apresentar neste momento somente os dados sobre contratos com empresas das áreas de vigilância e segurança patrimonial; conservação e limpeza predial; locação de mão-de-obra em geral; e suporte, controle e apoio à administração de edifícios públicos. Essas empresas permaneceram por longo período prestando serviços mediante dispensas e inexigibilidades de licitação e até por pagamentos realizados através de indenizações, sem qualquer contrato formal.

Sr. Presidente, senhoras deputadas, senhores deputados, as empresas investigadas receberam dos governos de Paulo Souto e César Borges, no período de 1997 até fins de 2006, o assustador montante de quase 1 bilhão e 400.000.00 milhões de reais. É importante observar que apenas sete grandes empresas abocanharam um faturamento de quase 74% desse valor, o que corresponde a mais de 1 bilhão. O número das empresas de maior faturamento aproxima-se, “coincidentemente”, do denominado G-8.

Vou detalhar apenas alguns exemplos entre as empresas envolvidas no esquema investigado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público Estadual: Postdata Serviços e Gestão de Saúde Ltda.; Organização Bahia Serviços de Limpeza e Locação de Mão-de-Obra Ltda.; Seviba – Segurança e Vigilância da Bahia Ltda; e, além delas, a ONG Organização de Auxílio Fraterno - OAF.

De acordo com o sistema de controle do Estado – Sicof – existem registros de pagamentos para a Postdata Ltda, no período de 1997 a 2006 correspondentes a exatamente 250 bilhões 165 milhões 712 mil e 43. É dinheiro pra dedéu, como costuma dizer o povo da Bahia. Dinheiro público, pago pelo Estado, pelo Executivo Estadual Assim, esta empresa posiciona-se em 1º lugar em faturamento entre todas as empresas analisadas. Entre 1997 e 1998 seus contratos saltaram de menos de 5 milhões der reais para mais de 23 milhões e 500.000 reais, crescendo incríveis 370%. Segundo a imprensa, já passaram pelo seu quadro societário alguns dos principais membros do chamado G-8.

Ainda de acordo com o mesmo Sicof, existem registros de pagamentos para a Organização Bahia Ltda. desde 1997. No período de 1997 até 2006, a empresa recebeu do Poder Executivo Estadual a importância de 172 bilhões 289 milhões 667 mil e 34 reais. Às vezes, os valores causam estarrecimento, mas é isso mesmo. A Organização Bahia coloca-se em 2º lugar em faturamento entre todas as empresas analisadas.

Só de 2003 para 2004, o valor do contrato cresceu de menos de 10 milhões de reais para mais de 27,2 milhões de reais, ou seja: 172%. Considerando-se o período entre 2002 e 2006, que corresponde ao mandato do ex-governador Paulo Souto, observa-se o crescimento estrondoso dos valores faturados, um crescimento de quase aproximadamente 758%.

Segundo o que consta no Sicof, existem registros de pagamentos para a Seviba Ltda. desde 2002. No período de 2002 até 2006, a empresa recebeu do Poder Executivo Estadual a importância de 172 bilhões 058 milhões 485 mil e 42 reais. Como se vê, praticamente um empate com a Organização Bahia. Os valores apresentam crescimento entre 2002 e 2006 de 193,84%. A Seviba situa-se em 3º lugar em faturamento entre as empresas do setor.

Os controladores acionários dessas empresas tinham óbvias relações pessoais e políticas com a oligarquia dominante, como apontou a imprensa e o próprio trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal. Havia um óbvio conluio entre o Estado baiano e essas empresas durante o domínio oligárquico.

O caso da Organização de Auxílio Fraterno – OAF - é particularmente estarrecedor. Tratava-se de uma ONG anteriormente muito respeitada pela sociedade baiana. Teve sua credibilidade completamente destroçada pelo governo Paulo Souto, envolvida em toda sorte de irregularidades.

Existem registros de pagamentos para a OAF no período de 1997 a 2006. Nesse período a instituição recebeu do Poder Executivo Estadual a importância de 95 bilhões 689 milhões 236 mil e 59 reais. Deste total, 55 bilhões 082 milhões 417 mil e 37 reais estão registrados no Sicof e 40 bilhões 606 milhões 819 mil e 22 reais estão registrados apenas na contabilidade da Ebal – Empresa Baiana de Alimentos –, que não registra seus pagamentos no Sicof. Os fatos relativos ao contrato com a Ebal constam em relatório da Auditoria Geral do Estado – AGE – e foram apurados também por uma CPI da Assembléia Legislativa da Bahia.

O contrato 073/03, celebrado entre a Empresa Baiana de Alimentos e a OAF, em 07/10/03, apesar de ter um valor mensal previsto de 100 milhões 323 mil e 04 reais aumentado, em outubro de 2005, para 240 milhões 429 mil e 53 reais mensais, resultou em um dispêndio total de 40 milhões 606 mil e 818 reais, como já dito, até o final do ano de 2006.

Pois é, entre as irregularidades verificadas, destacam-se a burla ao processo licitatório, mediante contratação irregular da OAF, por dispensa de licitação, incorrendo os gestores em ação de improbidade administrativa, e a utilização de organismo “sem fins lucrativos” e de caráter “filantrópico” para justificar dispensas irregulares de licitação.

Relato tudo isso para esclarecer que o caso da Ilha do Urubu, como disse antes, não constitui uma exceção. Era uma prática comum nos governos oligárquicos. Infelizmente. Essas revelações como se sabe, não constituem grande novidade. Estão nos autos, como se costuma dizer. Estão disponíveis, são públicas. E elas revelam, insista-se, a privatização completa do Estado então.

Hoje as contas do Governo estão abertas. Não apenas os deputados, mas toda a sociedade, podem gozar do direito de fiscalizar a aplicação do dinheiro público. Todos são convidados a fazê-lo. Interessa ao governo Wagner que o povo e os deputados fiscalizem com atenção como o dinheiro público é aplicado. Transparência é um princípio do governo republicano e democrático que vigora em nosso Estado.

Parafraseando Vargas Llosa, poderíamos denominar todas essas irregularidades, todos esses escândalos, como uma autêntica festa do Urubu. Felizmente, com a vitória de 2006, com a vitória de Wagner, com a sábia decisão do povo da Bahia, esse tempo já passou. Só se espera que a Justiça aja e os que forem efetivamente culpados sejam punidos. A impunidade não pode prosperar entre nós. Quando se faz justiça, afirma-se o Estado democrático. E esse é um desejo de todos nós.

Muito obrigado.

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