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domingo, 25 de maio de 2008

Maio, mês histórico para o mundo

É proibido proibir!
Marcelo Barros *

Esta expressão é um grito de liberdade que, para muitas pessoas mais velhas, traz recordações importantes e renova um compromisso que, hoje, toma outras formas de expressão, mas mantém sempre o significado de uma vocação para a utopia. Não a utopia compreendida como fantasia irrealizável e sim como busca de um mundo novo possível. Para você, o que evoca este grito: "é proibido proibir"? Talvez alguns lembrem as experiências de Summerhill e as idéias de A. S. Neill ao propor uma educação baseada na "liberdade sem medo". Outros pensarão simplesmente em Paulo Freire e sua pedagogia para a liberdade. Certamente, muitos se recordarão de que, há 40 anos, vários países do mundo viveram o maio de 68, com multidão de jovens nas ruas e este grito que empolgava grande parte da humanidade: é proibido proibir! Sabemos que controlar o passado é uma forma de pretender dominar também o futuro. Pode ser que este seja o motivo pelo qual esta pergunta é incômoda. No fundo, aparecem poucas matérias na imprensa sobre os acontecimentos de maio de 68 e quase sempre sob o prisma negativo. Para os que detinham o poder, tratava-se de uma contestação ao domínio da própria cultura ocidental que até ali dominava tranquilamente o mundo inteiro. E vinha aquele movimento juvenil que punha toda a sociedade em crise. No Brasil, dominado por cruel ditadura militar, o país vivia a falta de democracia, a supressão dos direitos constitucionais, a censura total aos meios de comunicação e a perseguição a qualquer oposição. Apesar disso, em 68, os metalúrgicos de Contagem (MG) e de Osasco (SP) fizeram as primeiras grandes greves de resistência à ditadura militar. Era, então, quase normal que os donos do poder julgassem que tudo aquilo estivesse concatenado. Segundo eles, operários de Contagem e estudantes de Paris tinham um só comando e obedeciam aos mesmos princípios. Havia, certamente, um agente de Moscou manipulando as teias e forçando pessoas do mundo inteiro a aderir ao comunismo internacional. De fato, naquele maio, em todo o planeta, multidões, sem ter combinado nada entre si, iam às ruas e promoviam manifestações em Paris, Londres, Madri e Roma, na Tchecoslováquia, em Moscou, em Hongkong, como em Nova York, Los Angeles, Miami, México e Panamá. Gritavam e lutavam contra os fundamentos sobre os quais se assentavam o poder social, político e religioso. Não queriam conquistar o poder. Lutavam apenas para ter o direito de decidir seu futuro contra a guerra, a injustiça, a fome, a indiferença, a corrupção. O movimento de 68 tinha um caráter internacionalista, policultural e interclassista. Possuía uma variedade de componentes que acabaram unindo as manifestações estudantis por uma relação mais justa entre escola e vida aos protestos operários por melhores condições de trabalho e salários. Em Londres e Paris, o movimento por uma outra política tomou uma cara mais artística. Em Praga, uma fisionomia mais diretamente revolucionária e aparecia como se fosse contra o império soviético. A revolução de 68 pretendia transformar o mundo através da abertura da sociedade às diversas culturas e ao milagre da beleza e da arte. Palhaços, saltibancos e atores eram os grandes apresentadores do grande espetáculo que pedia liberdade e vida digna para todos. As próprias religiões não se sentiram confortáveis com as críticas e as propostas audaciosas de 68: autonomia do corpo e revolução sexual. Entretanto, as Igrejas cristãs não podiam negar que muitas das idéias de 68 tinham sido aceitas na Igreja no Concílio Vaticano II (da Igreja Católica) e dos encontros do Conselho Mundial de Igrejas (evangélicas e ortodoxas). Na América Latina, os bispos católicos, reunidos em Medellín (Colômbia), acolheram a caminhada das comunidades eclesiais de base, aprovaram que a pastoral fosse serviço à vida e não apenas à própria Igreja e, oficialmente, aceitaram a Teologia da Libertação. Da parte evangélica, em 68 aconteceu a 4ª Conferência geral do Conselho Mundial de Igrejas em Upsália (Suécia). É significativo que o tema desta reunião tenha sido a palavra de Deus: "Faço novas todas as coisas" (Apoc. 21, 7). A assembléia foi marcada por manifestações de jovens que queriam ter o mesmo direito de participação e votos dos bispos. Esta relação entre fé e sociedade fez com que as manifestações por uma Igreja mais igualitária se expressasse também por uma sociedade mais justa e mais livre. A resposta dos governos foi brutal e, como sempre, violenta. Afinal, não se brinca com quem contesta o próprio poder. Tanques na rua assassinaram a primavera de Praga e tentaram afogar qualquer grito por liberdade. Certamente, apagaram muitas esperanças, mas não conseguiram assassinar as idéias. A eleição do presidente Fernando Lugo no Paraguai, o processo de mudanças na Bolívia, no Equador e na Venezuela testemunham que a humanidade continua desejando uma nova primavera de liberdade. Estes sonhos ajudam o sol nascer.

* Monge beneditino, teólogo e escritor. Tem 30 livros publicados.

Fonte: http://www.adital.org.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=33113

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