Frei Betto ressalta a importância dos acontecimentos do ano de 1968 no enfrentamento à ditadura, mas aponta a falta de apoio popular como decisiva para a derrota dos movimentos. Em termos de militância política pessoal, o que representou o ano de 1968 para você?
- Frei Betto - Ao retroagir meu olhar ao ano de 1968, me pergunto como fui capaz de me envolver com tantas atividades. Estudava filosofia nos dominicanos e antropologia na USP; era chefe de reportagem da Folha da Tarde; atuava como assistente de direção do Teatro Oficina; militava na Ação Libertadora Nacional (ALN), comandada por Carlos Marighella. No jornal, eu monitorava as matérias sobre as manifestações estudantis e a guerrilha urbana, dando destaque a tudo que desgastasse a imagem da ditadura e ressaltasse a resistência ao regime militar. Portanto, de 1968, ao passar dos 23 aos 24 anos, guardo a lembrança de um dos mais intensos períodos de minha vida, acalentado pela vitória dos vietnamitas sobre os estadunidenses e a revolução musical promovida, no Brasil, pelo tropicalismo; e, no exterior, pelos Beatles.
- Fórum - Como você avalia a importância das manifestações estudantis daquele ano?
- Betto - Elas foram fundamentais para questionar a ditadura que, acuada, se viu obrigada a colocar nas ruas as Forças Armadas, o que induziu parte do movimento estudantil à luta armada. Essa conjuntura engendrou o AI-5, o golpe dentro do golpe militar, endurecendo o regime.
- Fórum - Qual o legado destes movimentos para os dias de hoje?
- Betto - O maior legado é a capacidade de mobilização do movimento estudantil, como recentemente se viu na Universidade de Brasília, com a deposição do reitor e do vice-reitor. Pena que, hoje, os fatores de desmobilização sejam mais fortes que os de mobilização. Mas ficou a certeza de que é na juventude que nos impregnamos de valores éticos, revolucionários, solidários, na busca de um “outro mundo (e Brasil) possível”.
- Fórum - Vendo essa época a partir de hoje, que tipo de ações você acha que foram equivocadas e quais outras poderiam ser tomadas para enfrentar a ditadura militar?
- Betto - Nosso maior equívoco foi não saber fazer trabalho político junto aos mais pobres. Queríamos fazer revolução pelo povo e para o povo, não com o povo. Era elitista nossa forma de luta. Tínhamos quase tudo: coragem (muitos morreram torturados ou baleados, deram a vida por aqueles ideais); dinheiro (das expropriações bancárias); armas (tomadas de policiais e militares); ideologia. Mas nos faltou o essencial: apoio popular.
Fonte: Blog de um Sem Mídia
1 Comment:
É interessante como, em Riachão, e via de regra nos interiores afora, a juventude não consegue ainda perceber e se posicionar diante de situações que, lá em 68, Frei Betto e tantos outros foram capazes de ler corretamente e enfrentar. Por isso, é valioso continuar tentando inspirar as pessoas por aqui, como faz este post.
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